No jardim, ao lado do portão de casa, tem uma mangueira frondosa. Parte de sua copa invade a calçada de modo que, na época dos frutos, toda a vizinhança tem acesso a mangas deliciosas, doces como mel.
Em certa ocasião em que a vizinha passeava com seu cão na frente de casa, uma manga madura caiu no pé dela. A mulher ficou muito brava, calçava sandálias. Onde já se viu plantar uma mangueira ali, dizia ela enraivecida. Queixou-se do pé dolorido, sentia o hematoma, teria que ir ao médico, poderia perder a unha. Queria que eu cortasse a árvore. Segundo ela, eu era a culpada pelo acontecimento desagradável. Afinal, eu tinha deixado a mangueira crescer para fora do meu terreno. Deveria, ao menos, ter recolhido os frutos maduros!
Olhei para o pé machucado. Não estava nem roxo, mas propus acompanhar a vizinha ao pronto-socorro. Pedi desculpas pelo ocorrido. Prometi colher as mangas maduras.
Mas a mulher estava tão enfurecida que nem me ouviu direito. Voltou para casa falando sozinha. Passou o dia remoendo o episódio da manga assassina e espalhou no bairro o quanto eu era irresponsável, que as mangas poderiam machucar crianças e tudo mais.
Uma semana depois, a vizinha continuava resmungando. E de tanto coçar o pé, a pele foi ficando irritada. A mulher não conseguia esquecer o trauma, o pé, a manga, a vizinhança inconsequente e culpada por sua dor. Presa nesses pensamentos, continuou esfregando e cutucando o coitado do pé, de modo que, mais alguns dias, acabou mesmo aparecendo uma ferida.
Mas a vizinha não me perdoava pelo ocorrido. Portanto, como uma bola de neve que vai rolando e crescendo, a cada dia, o problema do pé aumentava e a ferida piorava, tornando ainda mais difícil deixar para trás o evento fatídico que poluía sua mente. Finalmente, ela teve mesmo que consultar com um médico para fazer um curativo que a impedisse de continuar cutucando o machucado.
Ainda bem que foi uma manga que caiu no seu pé, disse o médico ao ouvir a história da vizinha. Imagine se a árvore fosse uma jaqueira!
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