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  • Foto do escritorCMurville

Brilho na correnteza


Um feixe de luz incidiu sobre o riacho. Infinitas partículas luminosas mergulharam na água e começaram suas aventuras no mundo.

Uma fagulha de luz sentiu-se fortemente atraída pelas plantinhas que cresciam nas bordas úmidas do riacho. Aproximou-se delas e se fundiu a elas. Outra seguiu um peixe que nadava graciosamente, até alcança-lo. Queria aprender a nadar, ser um peixe também. Outra ainda ficou fascinada com as pedras que desenhavam o curso das águas. Virou pedra, enquanto sua irmã foi atrás de uma tartaruga que topou pelo caminho.

A primeira a atingir os cascalhos nas margens juntou-se a eles, transformando-se em um deles. Mas muitas mergulharam fundo e se metamorfosearam em grãos de areia no leito do riacho. Passou ainda um galho de árvore flutuando e incontáveis faíscas luminosas se agarraram a ele, finalmente se transformando no próprio galho.

Quantas experiências possíveis de se viver no riacho! Cada centelha divina podia escolher onde morar e por quais experiências passar neste mundo de contrastes e movimento, ora apresentando águas claras, ora escuras, revoltas ou tranquilas.

Enquanto ia sendo levada pela correnteza, uma porção de luz reconheceu suas irmãs na vegetação, nas pedras, nos insetos, nos animais... Notou que muitas delas já acreditavam ser o galho, o tronco, o cascalho, a larva, o peixe... Viviam em grupo com suas colegas vizinhas semelhantes a elas e não se recordavam mais do universo de possibilidades no qual estavam mergulhadas. Tinham dificuldade em lidar com diferenças e estavam apegadas a tudo que haviam juntado à volta delas. Uma ou outra chegava até a se achar mais especial do que as outras e olhava de cima suas irmãs. Havia peixe grande menosprezando os pequenos, girino falando mal do galho, lesma brigando com o cascalho, grão de areia irritado com a tartaruga! Ninguém se lembrava mais de que todos eram somente luz.

Porém, apesar dos desentendimentos aqui e acolá, o riacho amorosamente acolhia todo mundo de forma igual, conforme as necessidades e vontades de cada um, sem julgar nada ou qualquer ser. Afinal, cada centelha divina era sagrada, assim como toda situação que ela resolvesse experimentar ou as moradas que desejasse visitar.

A faísca luminosa que via a luz em tudo sabia que não estava só. Sentia-se parte de uma imensa vida que acontecia à sua volta, no riacho e em todo o universo.

Decidiu, então, ser como a correnteza que não se prende a nada. Passearia por todos os ambientes, densos e sombrios ou leves e luminosos, mas continuaria sendo ela mesma - simplesmente um brilho na correnteza!


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